O dia-a-dia e a agitação dos grandes centros urbanos tem se tornado cada
vez mais exaustivo: filas, superlotação dos transportes públicos,
engarrafamentos, violência urbana, pressão no ambiente de trabalho, o consumo artificial
excessivo, a concorrência, as situações involuntárias de competição e de
submissão aos tabus produzem uma cultura cujo traço principal é a desumanização.
A mente expressa seu desgaste por meio de reações fisiológicas e essas
manifestações, que não caracterizam uma doença, é o estresse, o estado do organismo submetido à tensão, quando o corpo
sofre reações químicas que, em excesso, podem prejudicar o indivíduo.
Na vida acadêmica, a pressão por produção do professor universitário e do
pós-graduando, cada vez mais exigidos, cada vez mais qualificados, cujo
trabalho está muito além do exercício da pesquisa e docência, mas que, em face
das políticas públicas derivadas da reforma da educação superior, os induzem de
forma muitas vezes alienada à complementação salarial e à ideologia do produtivismo acadêmico.
Este traço central da cultura da nova universidade pública compele a
todos ao individualismo e à competitividade
que acentua a sobrecarga psíquica. Poucos percebem o peso da instituição sobre
os ombros e o naturalizam como seu e muitas vezes projetam nos colegas esta
perversa cultura da universidade pública e não se vê da mesma forma. O conflito
torna-se a base das relações de trabalho. Todos sofrem à exaustão e passam a
ser reféns da medicalização da sociedade.
Sob essa ótica o professor pesquisador,
enfaticamente, e o pós-graduando, envolvido nesse processo, defrontam-se com
atividades obrigatórias, quais sejam: publicar determinada média anual de
artigos científicos em periódicos classificados pela agência ou em editoras de
renome; lecionar na graduação e na Pós-Graduação; realizar pesquisas
financiadas por agências de fomento com relativo prestígio acadêmico; realizar estágios pós-doutorais enfrentando péssimas condições de vida nestes períodos,
além de se verem em face da resistência e da oposição de seus próprios colegas
de unidade acadêmica; proferir palestras e conferências em eventos nacionais e
internacionais e muitas vezes realizar trabalhos administrativos nas
universidades em que atuam preterindo compulsoriamente o trabalho acadêmico e
científico.
O professor e o pós-graduando que assumem esse cotidiano
alienado mediado pela CAPES e pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, têm seus
processos formativos profundamente modificados pela nova função da universidade
pública em razão do movimento socioeconômico em curso. Eles, portanto,
definem-se por meio de sua prática, em conformidade com a ideologia do produtivismo acadêmico, com a política
de Estado e a atual cultura da universidade.
O quadro político institucional da universidade modifica e intensifica o
trabalho, ao mesmo tempo em que impõe o tempo da economia ao tempo acadêmico.
Este processo tem como resultado o estranhamento do professor de seu trabalho e
do produto dele. Desse modo o pesquisador e seu grupo de pesquisa estranham-se
a si mesmos, produzindo um ambiente de sofrimento.
Hoje a dificuldade na obtenção de emprego para a mão de obra
superqualificada, a falta de bolsas de estudo em quantidade suficiente para
atender à demanda das pós-graduações, num momento em que o pesquisador é
culturalmente impelido a constituir família e entrar efetivamente no mercado
produtivo, são algumas das razões que intensificam o sofrimento pessoal
diminuindo as expectativas de sucesso do aluno. A exposição do professor e, de
forma acentuada do pós-graduando tornam-se problemas médicos, quando, de fato,
o sofrimento tem origem na racionalidade institucional. Os medicamentos são
perversamente um meio para adaptação destes sujeitos à sociedade e à
instituição anômalas. Lembrando a crueza de Nelson Rodrigues em “A Vida Como
Ela É”, os remédios são uma adaptação à doença socialmente produzida mediada
pela universidade em geral, especialmente a universidade pública. Isto revela a
naturalização da doença numa sociedade mórbida.
numa sociedade moribunda, eu diria! Vamos então criar novos paradigmas, que tal?
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