01/11/2012

Leis de privatização de escolas e universidades na Rússia


Os tentáculos da prevalência financeira:


A educação pública na Rússia pode estar com os seus dias contados. Uma lei federal aprovada pela Duma (câmara baixa da Assembleia Federal da Rússia) em abril de 2010 e que entrou em vigor no mês de julho mudará a cara das escolas e universidades no país. A lei permite que as instituições educativas funcionem "a partir dos princípios do mercado” e tenham direito de “se envolver em atividades geradoras de renda”.

A nova lei soa ainda mais alarmante quando se leva em conta que menos de 1% dos estudantes de todo o país frequentam colégios particulares. E este número cai pela metade quando analisados os dados de pré-escolas e jardins de infâncias. No Brasil, 15% dos alunos do ciclo básico estão na rede privada. A lei federal altera o estatuto legal das instituições existentes “com o objetivo de melhorar a eficiência dos serviços públicos e municipais e para otimizar a modernização do setor”, segundo o comunicado oficial dos relatores da lei.

As universidades também serão afetadas. A previsão é que pelo menos 20% das universidades russas fechem as portas até 2014 ou tenham que passar por fusões com outras instituições de ensino. O ministro de Educação e Ciência da Rússia, Dmitry Livanov, declarou que “não importa se a faculdade é pública ou privada; o que importa é a qualidade”. Livanov defende que a redução do número de universidades aumentará a qualidade das mesmas.

No entanto, há aqueles que apontam o lado positivo da nova lei. “Normalmente, nós temos que esperar a aprovação do orçamento do Estado para fazer qualquer mudança na escola. Agora temos independência”, explica o diretor de um colégio da capital.


A aplicação prática da lei ainda é pouco clara para pais, alunos, professores e especialistas. “Na educação, isso significa que um determinado conjunto de serviços prestados será financiado pelo Estado e outras atividades serão comercializadas. E o financiamento também passa a ser per capita. Ou seja, escolas e universidades pequenas estarão em uma situação muito difícil”, explica para o Opera Mundi Anna Ochkina, chefe do Departamento de Metodologia de Ciência, Teorias Sociais e Tecnologias da Universidade de Penza.

“O período estipulado para a transição já acabou e continuamos sem saber as reais consequências. A essência desta lei é a restrição das obrigações sociais do Estado nas esferas da Cultura, da Educação e da Saúde”, conclui Ochkina. Em uma manifestação no início do mês, o líder do partido Yabloko, Sergey Mitrokhin, lembrou a importância de que os protestos continuem e mencionou que “a saída do ministro da Educação anterior [Dmitri Fusenko] foi uma importante vitória da oposição”. Fusenko foi ministro da Educação na Rússia de 2004 até maio deste ano e é frequentemente citado como um dos principais responsáveis pela privatização da educação na Rússia. Mas apesar da nomeação de um novo ministro, as reformas continuam.



“As autoridades têm medo de que os cidadãos tenham acesso à educação. Eles têm medo de que as pessoas exijam nas ruas o fim do regime de Putin. Por isso eles querem destruir a nossa capacidade intelectual”, afirmou Mitrokhin. “Putin aumenta os gastos de Defesa e diminui os de Educação. Mas ele esquece que, como disse [Otto von] Birsmarck, a Guerra Franco-Prussiana não foi vencida por um soldado e sim por um professor”.

De acordo com o censo de 2002, a taxa de alfabetização média da Rússia é de 99,4%. E segundo um relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgado em setembro, 54% dos russos entre 25 e 64 anos possuem diploma universitário, colocando a Rússia em primeiro lugar em todo o mundo.

Pavel Kudyukin, professor da Universidade Estatal da Rússia, argumenta que educação pública tem a função de dar as mesmas oportunidades a todos os cidadãos, independentemente da classe social. “Sem a educação financiada pelo governo, criaremos uma sociedade dividida em classes. A luta por uma educação pública é uma luta pela democracia real. O que estão fazendo com o nosso ensino é uma barbárie”.


Sandro Fernandes (OPERAMUNDI, 01/novembro/2012, operamundi.uol.com.br) 

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